POSICIONAMENTO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE HEMODINÂMICA E CARDIOLOGIA INTERVENCIONISTA (SBHCI) SOBRE A PANDEMIA COVID-19
Durante os últimos dias, temos vivenciado momentos de incerteza e de grande preocupação diante da pandemia do COVID-19, a qual já se configura como problema real e grave em nosso País, com potencial claro de alastramento rápido. A experiência já reportada em outros países demonstra que as consequências à saúde populacional podem ser catastróficas, principalmente nos indivíduos com idade avançada e com condição clínica mais debilitada ou vulnerável. No geral, a maior parte dos pacientes apresenta formas brandas de manifestação clínica; entretanto, alguns pacientes, especialmente idosos ou com comorbidades, são mais propensos a apresentar formas graves da doença.
Do ponto de vista da saúde pública, há um risco elevado de mortes, sequelas, além da sobrecarga na utilização dos recursos do sistema de saúde. O avanço da epidemia vem sendo atentamente monitorado e o Brasil já se encontra na fase de propagação exponencial da epidemia em alguns estados. A cada hora que passa, o extraordinário incremento de novos dados, relatos, artigos científicos e posicionamentos de entidades médicas e governamentais, respalda a necessidade da implementação de medidas extremas que, mais que tudo, evidenciam os desafios de se lidar com uma situação de crise e risco à saúde sem precedentes em nossa geração.
O ponto central da estratégia de enfrentamento que vem sendo proposta é a contenção da epidemia, que requer adesão maciça às medidas de higiene pessoal, proteção apropriada e distanciamento social, particularmente dos pacientes de alto risco (idade > 60 anos, imunossuprimidos e/ou com comorbidades) no sentido de limitar a propagação do vírus e reduzir sua morbimortalidade. Medidas mais contundentes têm sido ultimamente propostas com isolamento social da população por uma janela de tempo difícil de definir e que vai requerer vigilância epidemiológica intensa em sua interrupção, diante do risco potencial de recorrência.
Para os profissionais da área de saúde, de maneira particular, o momento tem exigido readequações e novos protocolos de assistência em situações sob maior risco de exposição. Infelizmente, dentro desse cenário, não temos todas as respostas nem pareceres definitivos até o momento para as inquietantes questões ainda em aberto. Mesmo assim, a SBHCI tem acompanhado atentamente o desenrolar dessa situação e busca trazer, neste documento, algumas considerações e orientações sobre as implicações do COVID-19 na prática médica diária e na realização de procedimentos percutâneos cardíacos.
Medidas gerais de enfrentamento:
- Limitar a exposição social.
- Rigor na higiene pessoal.
- Isolamento domiciliar dos infectados com formas brandas.
- Suporte hospitalar com isolamento para os infectados com formas graves.
- Quarentena para os contactantes suspeitos próximos.
- Prioridade na alocação dos recursos de saúde para urgências e emergências.
- Proteção dos profissionais envolvidos no cuidado de pacientes.
Evidências para guiar recomendações relativas ao manejo dos pacientes que necessitem ser submetidos a procedimentos no laboratório de hemodinâmica ainda são limitadas; entretanto, decisões rápidas são necessárias no enfrentamento desse problema. De maneira geral, recomenda-se seguir atentamente as recomendações do Ministério da Saúde (MS), Autoridades Sanitárias locais e protocolos Institucionais. Além dos múltiplos fatores tipicamente considerados no processo decisório, aspectos relativos às particularidades do cuidado cardiovascular de pacientes infectados, ao risco de propagação da doença para outros pacientes e profissionais da saúde e à alocação prioritária de recursos médicos no contexto da pandemia precisam ser observados de forma individualizada, de acordo com a realidade local. Importantes entidades médicas internacionais tem se manifestado nesse sentido, ajustando a prática às realidades locais*,**. Em nosso contexto, também recomendamos a adequação de orientações adicionais, de acordo com a realidade e o protocolo assistencial em cada Centro.
Orientações específicas:
- Postergar a realização de procedimentos eletivos em pacientes infectados ou suspeitos.
- Minimizar o número de pessoas no laboratório de hemodinâmica, readequando escalas para o fluxo reduzido de procedimentos e restringindo a permanência de acompanhantes.
- Em pacientes infectados ou suspeitos, limitar a realização de procedimentos hemodinâmicos a situações de emergências cardiovascular, como bloqueios atrioventriculares de alto grau, infarto agudo do miocárdio com supradesnível de segmento ST e síndrome coronária aguda sem supradesnível de segmento ST com critérios de instabilidade imputados à doença coronária. Nos casos sem critérios de instabilidade, recomenda-se postergar até o momento em que se encontre em uma fase não infectante.
- Priorizar o teste para o COVID-19 em médicos e profissionais de saúde com suspeita de infecção.
- Sobre a realização de procedimentos eletivos em pacientes sem infecção ou suspeita, até o presente momento, não existe recomendação formal do MS para o sistema público. Já a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) orienta o adiamento de exames não urgentes***. Des
- ta forma, recomenda-se a individualização e adequação de tais orientações de acordo com a realidade e situação local.
- Minimizar a permanência hospitalar do paciente após o procedimento.
- Prover proteção anti-infecciosa apropriada e rigorosa para pacientes e profissionais de saúde no laboratório de hemodinâmica.
- Atuar com atenção redobrada em conjunto com os setores de controle de infecção de cada Instituição nos quesitos relacionados a proteção individual da equipe assistencial. Muitos fluxos e protocolos estão sendo
- aplicados****, mas precisam se adaptar à infraestrutura de cada Laboratório. Lembrar que tão importante quanto a paramentação dos profissionais é a correta e segura retirada dos equipamentos de proteção individual.
• Assegurar a higienização efetiva da sala após os procedimentos, com fluxo cuidadoso dos descartes para o expurgo. Nos serviços com mais de uma sala de hemodinâmica, recomenda-se reservar uma delas para procedimentos em pacientes infectados.
Em relação aos procedimentos de Cardiopatias Congênitas, sabe-se, até o momento, que há menor incidência da manifestação clínica do COVID-19 entre crianças, com menores taxas de complicações e óbito. No entanto, não há relatos na literatura mundial do acometimento desta infecção em crianças portadoras de cardiopatias congênitas ou adquiridas e suas potenciais complicações. Mesmo assim, além das medidas gerais a serem empregadas com rigor, também recomendamos a adequação de orientações adicionais de acordo com a realidade e protocolo assistencial local.
Orientações específicas:
- Pacientes eletivos no laboratório de cateterismo: pacientes estáveis, sem perspectiva de evolução precoce (nos próximos 3 meses, a princípio) de sua doença deverão ter seus procedimentos adiados.
- Pacientes com doença em evolução, que necessitam de definição de anatomia ou estado funcional e que deverão ser submetidos à cirurgia cardíaca neste período – podem ser submetidos a cateterismo diagnóstico ou intervencionista, para estabilização ou definição de conduta cirúrgica.
- Pacientes com sintomas ou instáveis: devem ser submetidos a cateterismo diagnóstico ou intervencionista, principalmente se há perspectiva de melhora clínica após o procedimento, devendo os casos ser discutidos individualmente em cada Instituição.
Destacamos ainda que outras orientações mais específicas para familiares e pacientes portadores de cardiopatias congênitas estão sendo elaboradas e serão disponibilizadas em breve.
Por fim, ratificamos que continuaremos no trabalho incessante e contínuo, acompanhando com atenção à evolução dos fatos, e priorizando a segurança e bem estar dos nossos pacientes e profissionais. Novas informações, atualizações e/ou recomendações poderão ser encaminhadas a qualquer momento.
18 de março de 2020
Diretoria SBHCI